terça-feira, 3 de março de 2020

Nem Papa, nem bispo!

Na centenária Congregação Cristã no Brasil, não tem politicagem nem espaço para proselitismo. E as contas da igreja estão abertas

Postado em 03/03/2020 no site PITOCO



Cascavel, 19 horas de sábado: noite “mundana” de carnaval. Um ancião sobe ao púlpito no templo da Congregação Cristã no Brasil, em frente à Praça Rui Barbosa. Ele tem um calhamaço em mãos. É a assembleia anual de prestação de contas da igreja. Tim-tim por tim-tim, detalhado, auditado, aberto e transparente.

Na vasta “plateia”, à direita do ancião, homens vestindo terno e gravata. À esquerda, separadas deles, mulheres de cabelos cobertos por véus brancos. Entre aqueles que ouvem a pregação, estão médicos, advogados, engenheiros, magistrados, empresários e gente de todas as classes sociais.

O ancião chama-se Luiz Teixeira, 62 anos de Cascavel, mais de meio século de Congregação. Ele não é doutor, é cabeleireiro. E suas palavras simples, coloquiais, com alguma dificuldade na concordância, revelam sua efêmera passagem pela educação formal. “Não concluí nem o primário”, disse ele ao Pitoco, após o culto.

Luiz passa longe do perfil Edir Macedo, Malafaia, RR Soares ou Valdemiro do chapéu. A Congregação é o oposto disso. O pregador não pede dinheiro, não opera milagres. A igreja não tem programas milionários na TV, nem mesmo no rádio. Não abre o púlpito para discurso político.

“Se um membro com cargo na igreja decidir se candidatar, ele pode. Mas tem que se afastar do cargo e não terá espaço no culto para divulgação”, explica o ancião. Mais ainda: os congregados não podem sequer pôr o adesivo do “irmão” candidato no carro.

A Congregação não mistura fé com política. A força da denominação está no voluntariado. Ali todos são voluntários, inclusive os anciãos que comandam a pregação. Ninguém tem salário na igreja. Eles produziram a façanha de construir um templo com mais de 7 mil metros quadrados ao custo de menos de R$ 1 mil/metro quadrado - menos da metade um orçamento convencional.

A sabedoria secular dos congregados ganha relevância em um momento envenenado da política nacional, quando alguns católicos passaram a ofender o Papa por ter recebido Lula. Na outra ponta, outros condenam Bolsonaro por se ajoelhar para Edir Macedo, figura controversa da tal “teologia da prosperidade”.

Lula e Bolsonaro usam a fé do povo para obter votos? Alguns líderes religiosos se permitem usar com essa finalidade? São perguntas apenas. Provocado a respeito, o ancião da Congregação não quis manifestar sua opinião. Desprovido de canudo, mas sábio, ele não coloca o pé em bola dividida...

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